por Rodrigo Priesnitz
Quando comecei a me entender por gente, lá pelos idos de 1984, o
país inteiro embarcava em uma efervescente luta civil pela abertura democrática,
por direitos civis e o retorno de eleições diretas para Presidente da
República. Na verdade, 84 foi o auge de um movimento que iniciou na década de
70 e que explodiu naquele ano. Foi um momento ímpar de nossa breve história de
nação independente, republicana e democrática.
Já se passaram quase trinta anos desde aquela campanha popular.
Parece muito tempo e
para mim que ainda não cheguei aos quarenta, realmente é.
No entanto se comparado em relação à história de um país, significa quase nada.
Que dizer da nossa democracia? Tão jovem quanto as poucas décadas que nos
separam daqueles agitados anos.
Existem algumas exigências a serem feitas para que se afirme que
um período seja realmente democrático e aqui não há intenção de descrever uma
democracia e sim algumas qualidades que não a permitam existir. O voto dos não
alfabetizados, proibido por decreto em 1881, só veio a ser admitido novamente,
em caráter facultativo, a partir de 1985. Passaram-se 104 anos para que o
Estado, e parte da sociedade entendessem que apenas restringir o direito ao
voto não seria suficiente para extinguir o analfabetismo.
As mulheres só passaram a ter direito ao voto, por decreto do
Presidente Getúlio Vargas, a partir de 24 de fevereiro de 1932, ainda com
restrições, mas fruto de longa luta. Não seria loucura e nem exagero imaginar a
grande resistência e oposição à adoção desta medida por Getúlio Vargas. Os
"coxinhas" da época devem ter gritado, enraivecidos: “É uma medida
eleitoreira! O Presidente Getúlio Vargas quer, com essa vil atitude, ferir a
honra das famílias e conquistar o voto inconsciente das Senhoras, incapacitadas
a tamanha responsabilidade tão bem desempenhada pelos homens de nossa
democrática nação brasileira!” Alguém se
arriscaria a dizer que houve democracia de fato, antes de 24 de fevereiro de
1932?
Pois apenas cinco anos se passaram até que em 1937, o Presidente
Getúlio Vargas decretasse o Estado Novo e acabasse com os partidos políticos e
com as eleições livres, atribuindo-se poderes de ditador. A democracia viria a
sorrir aos brasileiros apenas em 1945, com a deposição do governo de Getúlio e
convocação de eleições gerais e assembléia constituinte com a participação de
todos os partidos, inclusive o Partido Comunista, fundado em 1922 e na
clandestinidade desde então. Ameaçada, a nossa jovem não resistiu dois anos,
pois o registro do Partido Comunista foi caçado, assim como todos os mandatos
de seus filiados, entre eles, Carlos Marighela, Luis Carlos Prestes, Jorge
Amado e outros. O PC havia conquistado quase 10% dos votos nas eleições livres
de 1945.
As instituições seguiram ameaçadas até em 1954, quando após forte
campanha
oposicionista de Carlos Lacerda, jornalista e radialista que
propagandeava jamais ter havido na república brasileira governo mais corrupto
do que o de Getúlio Vargas e que a política brasileira não passava de um “Mar
de Lama”, o Presidente deixou a vida para entrar na história e matou-se com um
tiro no peito, em seu quarto, no Palácio do Catete, sede do Governo Federal.
Getúlio havia sido eleito com o pé nas costas, como poderia ter afirmado algum
comentarista político da época.
Em 1964 todos já sabem, novas crises políticas que
desestabilizaram as instituições e nos jogaram a todos no mais triste e obscuro
período de nossa breve história. Uma ditadura civil-militar que permaneceu no
poder por longos 21 anos. Sem objetivo de se divagar sobre as atrocidades
cometidas pelos senhores que regeram aquele período de nossas vidas e nem mesmo
de explicar aquele golpe, registra-se apenas o fato de que nem todos os vilões
eram militares e que os braços daquela ditadura se estenderam por todos os
rincões deste país, tendo influenciado diretamente na vida de todos os cidadãos
e cidadãs.
Ao analisar brevemente o período que se passou até 1984,
constatamos apenas isso, que nossa democracia não é nada mais do que uma jovem
que ainda não chegou aos trinta anos e que busca estabilizar sua existência aos
trancos e barrancos. Certeza? Apenas que aos ditadores não restou lugar de
destaque na história, a não ser pelo batismo de algumas escolas e avenidas.
Talvez pela covardia de alguns ou pela preguiça de outros, ainda permanecem
ofendendo o legado daqueles que pagaram com a vida para que gozássemos da
liberdade que temos hoje. Mas aos lacaios, aos traidores, a estes não se
reservou sequer uma pinguela. Quantos sabem quem foi Lacerda?
*Rodrigo Priesnitz é
Tecnólogo em Gestão Pública, militante e filiado ao Partido dos Trabalhadores e
experimenta a atividade de blogueiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
O Ponta Esquerda não publica comentários ofensivos, que utilizem expressões de baixo calão ou preconceituosas, nem textos escritos exclusivamente em letras maiúsculas ou que excedam 15 linhas.