por
Rodrigo Priesnitz*
O comandante Mao
Tsé Tung, quando perguntado se os efeitos da Revolução Francesa
eram positivos ou negativos, respondeu simplesmente que ainda era
muito cedo para uma conclusão. Já haviam se passado mais de 150
anos entre a Tomada da Bastilha e a famosa frase e, talvez por
ironia, ainda hoje tem gente tentando entender o que Mao tentou
dizer.
A onda de
manifestações que se espalha pelo Brasil está fazendo às vezes de
"elixir revigorante" para muitos militantes. A comprovação
vem das redes sociais, onde os ativistas se mostram exultantes com a
força dos protestos. A frase de Mao Tse cabe aqui perfeitamente.
Ainda é impossível organizar uma única interpretação a respeito.
É tão complexo que políticos de direita e de esquerda ainda estão
perdidos.
Alguns acreditam
que as "hordas" estão indo às ruas protestar contra as
invasões indígenas, a legalização do aborto e da maconha e a
união civil entre pessoas do mesmo sexo e a favor da diminuição da
maioridade penal. Outros parecem estar mais preocupados com
conspirações oposicionistas manipulando e financiando o movimento
para desestabilizar os governos. Ainda que a grande mídia já tenha
mudado sua versão várias vezes, inclusive colocando seus “globais”
com o “olho roxo” em lindas peças publicitárias, o fato é que
para tristeza dela própria e também dos setores mais conservadores
da sociedade, as manifestações não tem na Presidenta Dilma e no
seu partido, o PT, o alvo principal de suas indignações.
Vou me arriscar
a afirmar que parece mais uma soma de toda a não conformidade ante
todos os males que assolam o planeta e a oportunidade de expressão
de todas as bandeiras que se julgam algozes dos mesmos. No entanto,
não ouso encontrar neste “achismo” alguma verdade absoluta,
embora entenda que mesmo não tendo elementos suficientes, alguns
apontamentos já são possíveis.
É uma mescla de
todas as lutas. É o grito contra a corrupção, mas que também não
se cala diante da existência de corruptores. Da luta pela
democratização dos meios de comunicação e contra as manipulações
dos grandes conglomerados. É o ódio ao sistema político defasado e
atrasado que privilegia a eternização de mandatos. É a revolta
contra uma Copa do Mundo que exige enormes investimentos públicos e que não deixa
muito claro qual seu legado ao povo brasileiro, mas que se apresenta
desde já como um evento elitizado, que acontecerá muito longe do
alcance dos trabalhadores. É a revolta perante uma Justiça que
insiste em continuar punindo rigorosamente o pobre, o negro e os
movimentos sociais enquanto adula carinhosamente os abastados. É
muito mais do que vinte centavos, sim.
É um fenômeno
que, em que pese ter contado com alguma organização e
liderança
para o estopim, deixou já há alguns dias de pertencer a este ou
aquele movimento social ou partido. Não existe liderança
reconhecida e legitimada e, como já testemunhamos, não apresenta
uma pauta unificada. Se algum partido ou movimento social acreditou
deter a hegemonia, já estão sem chão. As manifestações foram
tomadas por todos os povos, partidos e movimentos sociais. Os
partidos que se dizem à esquerda do PT exibem orgulhosos suas
bandeiras, aproveitando a oportunidade de aparecer para o mundo, de
alguma forma. Os petistas, alguns indignados ante os ataques ao seu
governo federal, outros revigorados e mesmo impressionados pelo vigor
das ruas, ainda acompanham reservadamente. Já os reacionários PSDB,
DEM e PPS escondem suas bandeiras, envergonhados. Eles sempre apelam
para a apartidarização da política, ou seja, para a despolitização
da política.
Aliás, os
reacionários são facilmente identificados nos debates. É aquela
velha máxima de “vamos protestar contra tudo isso que está aí!
Só não me venha levantar uma bandeira contra o meu preconceito!”.
É muito explícito o horror que causa a alguns jovens conservadores
de classe média a possibilidade de marchar ao lado de alguém que
leve consigo uma bandeira do movimento LGBT. Não sei avaliar se é
mais constrangedor para mim que escrevo ou se o é para quem lê,
constatar o número considerável de jovens contaminados com
sentimentos intolerantes às diferenças, aos sentimentos libertários
e à pluralidade inseridos em manifestações que clamam por mais
liberdade e democracia. Esse pode ser um efeito da timidez das
políticas públicas específicas para a juventude.
Desdenhar da
força das manifestações é idiotice. Olhar à distância é pouco.
Estar
alertas, atentos a
oportunidade de avaliar se os efeitos dos dez anos de governos
democrático populares serão duradouros ou perenes. Quem já
participou
de momentos assim, ou
estudou seus efeitos, seja
em 68, 79, 84 ou 92, para ficar apenas no Século XX, sabe bem
que a única coisa que não se pode prever é como
se dará o
seu desfecho, mas
sabe também que nada mais será igual como era antes. “Tudo
que se vê não é igual ao que a gente viu há um segundo. Tudo
muda, o tempo todo, no mundo. (…)
Como uma onda no mar.”
*Rodrigo
Priesnitz é Tecnólogo em Gestão Pública, militante e filiado ao
Partido dos Trabalhadores e experimenta a atividade de blogueiro.
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